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Na Guerra do Ultramar e não só - O Comando de uma LFG na Guiné (2)

 

O Comando de uma LFG na Guiné


                                                               2ª Parte

Primeiros tempos na Guiné




NRP Argos                

Cheguei à Guiné para assumir o comando da Orion e em meados de Outubro de 1972, após uma atribulada viagem aérea por força das avarias dos 2 motores da mesma asa de um velho quadrimotor DC-6, ocorridas entre as Canárias e Cabo Verde.

Aterrei em Bissau 5 dias depois de sair de Lisboa, à boleia de outro DC-6 de carga, sentado em cima de caixotes de sobressalentes de 2 velhos bombardeiros B-26 da 2ª Grande Guerra Mundial, cuja aquisição tinha levantado um grande alarido nos areópagos internacionais e que iam para Angola. 

Logo no dia seguinte à minha chegada, após os cumprimentos da praxe e um briefing sobre a situação militar no território, voltei a embarcar num pequeno avião pertença da marinha a embarcar no pequeno avião pertença da Marinha, destinado principalmente ao transporte de correio para as unidades que estavam fora de Bissau, para ver como era a “guerra”.

Depois de aterrar numa pequena pista de terra batida, desbravada no meio da floresta compacta Já muito perto da fronteira com o Senegal, subi para o camião conduzido pelo fuzileiro que me aguardava e ao fim de uns quilómetros de picada, vislumbrei no meio das árvores o que me pareceu ser um navio de guerra.

Na realidade lá estava uma LFG, atracada no pontão de madeira que servia a base de fuzileiros de Ganturé, na margem do rio Cacheu.

 

Lembro-me de ter reparado de imediato que na tolda, envolta da peça de ré, havia uma profusão de cunhetes de munições, bidons de combustível, um jogo de matraquilhos e até uma vaca viva que aguardava espaço nas frigorificas… estava noutra Marinha!

 

Depois do susto da praxe, a cargo dos fuzileiros que nessa noite simularam um ataque do inimigo, no dia seguinte fizemos a patrulha do rio na zona de operações que ia até à povoação de Binta, onde estava aquartelada uma companhia do Exército e perante os meus receios ao observar toda aquela alta vegetação junto às margens estreitas por onde íamos navegando, fui elucidado que não era dali que vinha o perigo mas sim das clareiras, onde os navios eram atacados.

Quando já me sentia mais descontraído recebemos um pedido de apoio dos fuzileiros que estavam a ser atacados numas dessas clareiras a célebre clareira do Tancroal, para onde nos dirigimos imediatamente à máxima velocidade. Eis que quando estávamos já muito perto e em “postos de combate”, o Comandante mandou parar o navio e perante a minha interrogação, apontou para o céu, onde se viam os nossos aviões e esclareceu-me que quando isso acontecia ele não entrava na zona de combate, porque na sua anterior comissão, também na Guiné mas como fuzileiro, tinha havido diversas baixas provocadas pelos nossos meios aéreos. Senti-me elucidado e em apenas 48 horas, já bastante preparado para o que se iria seguir…

Quando iniciei a minha comissão a iniciativa militar ainda nos pertencia. No final desse ano de 1972 foi lançada uma grande ofensiva contra um dos santuários do inimigo, a península do Cantanhez, situada na parte sudoeste do território da Guiné, entre os rios Cumbijã e Cacine.

Mas logo a seguir à morte de Amílcar Cabral, ocorrida em Janeiro de 1973, o curso da guerra sofreu uma drástica alteração, especialmente após serem abatidos vários aviões com mísseis Strella SA-7, quebrando a nossa supremacia aérea e prejudicando o imprescindível apoio às forças terrestres.











À táctica de guerrilha seguida até então sucedeu-se uma poderosa ofensiva do inimigo, que dispondo de mais e melhor armamento, passou a atacar fortemente os nossos aquartelamentos mais vulneráveis, Guidaje, na fronteira norte com o Senegal e Guilege e Guadamael, perto da fronteira sul com a Guiné-Conakri. Em Setembro o PAIG c declarou a independência e daí até ao dia 25 de Abril de 1974, a situação militar não parou de se deteriorar perigosamente.




Nesta fase do conflito fase do conflito, a Marinha desdobrava-se no apoio militar e logístico das forças terrestres empenhadas nas áreas com acesso marítimo. As LFG’s enfectuavam sobretudo a vigilância e patrulha do rio Cacheu no norte da Guiné e dos rios com bijan e cacine no sul com o objetivo de impedir ou dificultar a sua utilização pelo inimigo, mas também outras missões tais como o patrulhamento das águas territoriais e do arquipélago dos Bijagós, a escolta a partir da denominada “bóia de espera” dos navios militares e civis que demandavam o porto de Bissau, a escolta de outros meios navais ou embarcações civis nos rios em que isso era possível e necessário, o transporte e a projeção de forças terrestres e asseguravam também a defesa marítima do porto e cidade de Bissau.

Quer no comando da ORION, quer embarcado noutros navios, em apoio a substituição dos seus Comandantes nos seus impedimentos, testemunhei muitos e variados episódios ocorridos naquele período difícil de fins de 1972 até ao fim do conflito, que não seria possível narrar aqui, pelo que apenas referirei alguns que poderão dar uma ideia do ambiente que então se vivia nos rios Cacheu, Cumbijã e Cacine.





Nem todos esses episódios foram trágicos e os piores que recordo foram vividos no acompanhamento de acontecimentos que envolveram os militares as forças terrestres os grandes sacrificados naquela guerra.

Na Marinha, para além dos Fuzileiros, o meu grande apreço veio para as guarnições das Lanchas de Desembarque Médio (LDM’s), que para além da perigosidade das suas missões, viviam em péssimas condições de habitabilidade, agravadas pelo clima dos rios da Guiné.

Nas LFG’s, para além do sentimento de uma maior segurança incutido pelo seu elevado poder de fogo, as guarnições dispunham de razoáveis condições de vida com alojamentos climatizados e até uma melhor alimentação.




As outras Histórias sobre este assunto:



 




Luiz Pereira Vale

Oficial da Armada

ex-Comandante do N.R.P. Orion

Revista de Marinha, 985, Maio, Junho 2015









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