A célebre "Carta do Marítimo de Olhão"
Existem várias versões, algumas levadas ao exagero na tentativa de tornar o texto popularucho, perdendo-se obviamente o carácter 100% "Olhanense" da cena em que se pretendeu congelar a tipicidade das gentes de Olhão, sem as ridicularizar.
Não sendo de todo um Olhanense mas porque por lá vivi quase 30 gloriosos anos, este texto lembra-me o que de mais puro há nos genuínos Olhanenses. E conheci muitos...
Alguns jamais esquecerei...
O Eusébio tinha uma traineira de pesca que foi obrigado a abater pela União Europeia.
Mestre da sua traineira da Culatra que levei num voo a Glasgow.
Tudo legal, com bilhete e tudo. Catering a condizer com bolinhos com o emblema do Benfica.
Como Comandante exigi que um dos bolos tivesse a bandeira do Sporting...
Eu a Comandar um B-727 da Air Atlantis, tripulação toda arregimentada: a Chefe de Cabina era a minha mulher e o Co-Piloto o Papi que entretanto comprara a traineira ao Eusébio.
Um extraordinário baptismo de voo, para todos nós.
O Pinto da Alemanha: uma força viva, muito viva, da natureza.
Fugiu de barco para a América nos anos 60, mas numa paragem em Hamburgo o barco foi por ali ficando avariado até que ele resolve desembarcar.
Quando deixou definitivamente a Alemanha, nos anos 80, casado há muito com uma senhora alemã, tinha sido o proprietário de um Restaurante Argentino em Hamburgo!
Eu vi as fotos de todas as muitas celebridades deste mundo que por lá passaram.
Até o Frank Sinatra cantou lá com ele!
Contexto desta carta:
Um jovem pescador pouco dado às letras, pede a um companheiro da companha da pesca, mano Manel, em plena faina, que lhe escreva uma carta à namorada queixando-se das relações entre si e o pai dela.
Tentem perceber…
<< À diase do mar dase Berlengase, a sete braçase e mêa de mar, empensarem-se ase grosêrase.
Disto, vem de lá o cabrã do tê pai e me dezeu ele assim :
- Mó ó móce ! tu ése um montanhêre, tu fazes um grande salcrafice em virese ó mar.
- Ma o que é que você me dize, hom
- Digue-te iste e nã casase ca nha filha !
- Allamese! Farcisca! ê cá antese cria cu tê pai me desse doi ó trê estragaços da cara, que me dessesse aquil que tá ali da frente de gente.
Viémese pá terra e a companha do barque nã falava doutra coisa.
Disto, vem de lá o mano Zé Chaveca e me dezeu ele assim:
- Mó, ó móce! Tase-te a ralar?
- Atão nã m´ êde ralar?
- Nã te ralese rapá, se nã casarese cúa filha dele casase ca minha!
É pra que vêisase, Farcisca, cainda tenhe pretendentase.
Tu pen-sase cú tê pai é o Prencêse D. Carlos? A tua mãi a Rainha D. Imélia e os tês ermãos os Enlefantesinhos?
Alhamese! ele é mai brute cá mãi dos penhêrese do mane João Luice.
Dêxa lá cuma viage quê face ó mar de Larache , ganhe o denhêre às braçadase.
Compre um chapéu de côque, uma vengala botas de rengedêra e tapadoiro.
Passe a barlavante da tu porta e arraste os peses comó gale. Tu vêse me e falase-me, mai ê cá veje-te e nã te fale.
Ah! sabes o quê cá quere, é que nã falese mal da nha pelha prêces rebêres e tainquese.
Ai, se maparece alguma noda do mê corpe..
Digue logue que forem vocêse que me fizerem mal, calha bem !
Ah! sabes o quê cá quer tamém? É que nã te esqueçase dos mês doze brenhoisinhes (ponha lá iste da carta mano Manel quela logue mentende).
Olha, agora só da nh’ avó erdi deze moedase e o estrafêgo todo da canóa.
Ê cá bem sei que tense uma menita maineca de queztura e quése muite perfêta de mâose.
Também ê cá sou!...
Digue-tiste e nã memporta com o pórque do tê pai.
Perdoi a arção.
Embroise >>
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NOTAS:
estragaços da cara - bofetadas
companha do barque - tripulação do barco
penhêrese do mane João Luice -
João Lúcio, Advogado e Poeta Olhanense tinha um chalet, hoje histórico, transformado na Ecoteca de Olhão/Casa-Museu João Lúcio, na sua Quinta de Marim no meio de um pinhal nos arredores de Olhão (dentro da sede do Parque Natural da Ria Formosa)
O Chalet antes do restauro
Video do Chalet
mar de Larache - costa Marroquina, Noroeste
tapadoiro - polainitos