2ª Parte da História do Boeing B727
Clicar aqui para ver a 1ª Parte
Comecei a voar na TAP em 1971 como Co-Piloto de B707.
Até aí a entrada em Linha fazia-se sempre pelo avião menor mas por razões de acessos futuros com as previsiveis despesas com cursos sucessivos, foi decidido que não seria assim para o meu curso.
Sina minha já que na Força Aérea também não fiz o T-6 em Sintra mas sim em… Salamanca, 1963 (Ver aqui).
Três anos e meio depois de ter começado a voar o B 707, no dia 25 de Abril de 1974, acordei em plena Revolução dos Cravos para estudar o resto do meu curso teórico de Boeing B 747, antes de partir para Seattle fazer o simulador.
Sina minha…não podia ser um curso normal, como o de toda a gente.
Fui Co-Piloto de B747 durante a Revolução, o PREC e as independências das Províncias Ultramarinas (o Estado Novo dera-lhes esse estatuto. Não eram oficialmente “Colónias”).
Como consequência de todos estes acontecimentos somados, a frequência dos voos de B747 diminuiu drasticamente, até ao ponto de a TAP ter de vender metade da frota ao Paquistão, à PIA e a maioria dos voos passar a ser feita sempre com dois Comandantes e um só Co-Piloto que acabava por fazer uma média de uma única aterragem por mês…
E foi com toda esta falta de treino e proficiência nos dois anos anteriores que chegou o meu dia de ir a comando.
Valeu-me ter voado um mês com aterragens quse diárias na minha estadia em Karachi no verão de 1976, aquando da venda dos nossos amados B 747 à PIA (Ver aqui).
Fiz o último voo de Co-Piloto poucos meses depois na passagem de ano 1976 / 77 num voo Lisboa, Kinshasa, Joanesburgo, Kinshasa, Lisboa em B 747, claro.
E tive o previlégio de os dois Comandantes desse último voo me terem dado 2, duas ! 2 aterragens nesse percurso! Em Joanesburgo e em Kinshasa. Não é para me gabar, mas foram das melhores que fiz…
Com recurso a um “muito sofisticado (?!)” sistema áudio-visual autogerido pelos alunos, com base em dois projectores de slides e um leitor de cassetes que iam debitando a matéria mas que faziam normalmente grandes paragens porque aquilo empancava tudo e tinha de se chamar o técnico para harmonizar tudo de novo.
Sina minha… tenho sempre sorte nos cursos: o meu colega de aulas teóricas foi nem mais nem menos que o meu grande amigo Carlos Varanda.
Quando percebemos como aquilo funcionava, acabaram-se as investidas do técnico e passámos nós a fazer o trabalho em auto-gestão com passaetas a pé em cima dos equipamentos e outras actividades semelhantes que é melhor não mencionar…
Acabámos o curso teórico em tempo recorde, acho que uma semana antes do previsto e agendado.
Já no meu curso de F-86 conseguira economizar 5 meses e meio ao tempo do curso anterior…(Ver aqui).
Cockpit de um Boeing B 727 |
Findas as aulas teóricas, as muitas sessões de simulador e o Voo Base (voos de instrução, sem passageiros) fomos finalmente para a Linha, com passageiros e tudo mas assitidos por um Comandante encartado.
Desses voos assistidos em linha por outro Comandante, antes de eu ser largado, lembro-me principalmente dos dois primeiros.
O primeiro de todos, um Lisboa Geneve-Zurique, com o Comandante Queirós. No dia 6 de Abril de 1977 no CS-TBK
E lembro-me porque sendo o primeiro voo de todos como Comandante, embora asistido, o controlador suiço de Geneve resolveu mudar a pista no último instante e consciente da quase impossibilidade de uma aterragem segura naquelas condições me ter até perguntado:
- Você consegue?...
Com a minha nenhuma experiência em Comando e naquele avião (era o 1º voo e com a responsabilidade de ter a cabina cheia de passageiros, que nunca sabem o que está prestes a acontecer...) fiquei mudo aqueles milésimos de segundo que parecem sempre uma eternidade, sem saber o que lhe responder...
O Queirós disse-me rapidamente que sim, eu podia e assim aceitei a rasteira do controlador.
Mas o Queirós ensinou-me como fazer, sentado na cadeira atrás de mim:
- Reduz toda a potência, já! Trem em baixo! Não desças! Deixa a velocidade cair! Flaps todos em baixo! Aterra agora…
E lá passei eu aquela montanha entre Lion e Geneve com enorme razão de descida em direcção à pista mesmo em frente, a querer desaparecer-me debaixo do nariz do avião...
Mas fiz uma boa e segura aterragem.
Já na Placa do Aeroporto o Queirós ensinou-me mais uma coisa:
- Da próxima vez quando ele te perguntar se és capaz, responde-lhe:
- Eu não e você?!
Obrigado Queirós, lá onde estiveres.
Boeing B 727-100 |
O outro voo assistido de que me lembro, o 2º que fiz, foi um cargueiro a Londres, com escala no Porto. No dia seguinte, no CS-TBN
E quem me havia de calhar como Comandante assistente?
Nem mais nem menos que o Comandante Silva Soares.
O grande Senhor da TAP e da Aviação Portuguesa.
Comandante Silva Soares |
Vai ser o meu fim, pensei, mas tenho que passar por isto! E lá fui para as Operações, perfeitamente amarfanhado.
Tudo correu bem até à aterragem nocturna no Porto.
Uma avaria que requeria assistência da Manutenção local. O Técnico de Voo resolveu então ir para a Aerogare espairecer, pudera... mas eu decidi permanecer a bordo para me aperceber de toda aquela envolvência.
E o Comandante Silva Soares também…
Os dois sozinhos a bordo enquanto a Manutenção trabalhava...
E durante uma hora tive a mais completa e empenhada lição de Recursos Humanos na vertente Comandante de Avião que poderia ter tido.
O Senhor Comandante Silva Soares abriu o livro e naquela hora deu-me a mais fantástica aula teórica que tive em Aviação de Linha Aérea.
Nota aos filhos do Comandante Silva Soares: após ver o vídeo de Homenagem ao vosso Pai,
com ligação aqui em baixo, fiquei com a sensação que naquela noite no Porto ele viu em mim
mais um filho que merecia e precisava dos conselhos de um Pai
do que um comandante qualquer em instrução.
Depois de ver o vídeo, senti-me um de vós, não levem a mal...
Video de Homenagem ao Comandante Silva Soares no 69º Aniversário da TAP
Aproveitei tão bem a lição que sete meses depois estava a ser convidado para Verificador de Linha e Instrutor de Simulador, praticamente ao mesmo tempo que iniciava a operação no “antigo” Aeroporto do Funchal.
E 14 dias depois do meu treino naquele Aeroporto dá-se o terrível acidente do Funchal com o meu camarada de treino, o Comandante João Lontrão.
Nos primeiros 10 anos de B727, voei em operação contínua para Aeroporto do Funchal com menos 1.181m de comprimento do que actualmente tem.
Curiosidade:
À velocidade de 150km/h, a velocidade aproximada de aterragem de um avião, percorrer 1.181m leva mais de 28 segundos... Não acreditam? Façam as contas.
E voava para Ponta Delgada, que se considerava na altura um Aeroporto também difícil em condições marginais de situação meteorológica.
E obviamente que para todas as outras Linhas de Médio Curso que a TAP operava na Europa e em África.
Em 1986 fiz os primeiros voos para a Air Atlantis, a subsidiária de voos charter da TAP que operava principalmente a partir de Faro
Era uma operação simpática que deixava vontade de repetir.
A repetição deu-se no início do ano seguinte, com uma particularidade:
- Decidi abraçar a actividade do voo charter e assinei um contrato de dois anos com a Air Atlantis, não deixando o vínculo à TAP.
O último voo que fiz nos B 727 da TAP foi no dia 31 de Maio de 1987. No CS-TBW
Mas passei a voar, com imenso prazer e muita dedicação, os da Air Atlantis.
Assunto para uma outra história de uma forte ligação a este mágico avião que foi a minha Escola de Comando de Linha Aérea mas também uma Sala de Aulas como Instrutor que fui, em Simulador e em voos de Verificação para muitos futuros Comandantes da TAP.
Caríssimo Senhor Comandante Gabriel Cavaleiro, tive o privilegio de lhe ter sido "entregue" durante um mês no verão de 1987, como seu copiloto no saudoso Boeing 727 da AIA. Tinha acabado o Curso Geral TAP (24 CGPLA), seguido do curso de qualificação no Boeing, e aquela foi a minha primeira missão. Parte do meu curso foi "emprestada" á Air Atlantis. E que sorte a minha. Primeiro, por voar consigo, depois, por ter tido a oportunidade de voar um verdadeiro classico da "Golden era of Aviation", com o qual ainda hoje sonho. Lembro-me de cada voo que fizemos nesse verão já longinquo como se fosse hoje. Desejo-lhe saúde. Um forte abraço, Carlos Mirpuri
ResponderEliminarInfelizmente só hoje, 10 de Junho de 2022, é que li este comentário do meu amigo Carlos Mirpuri. Foi um prazer voar com o meu amigo, não só pelas excelentes aptidões técnicas como pela pessoa em si. Ficou no restrito grupo dos tripulantes, das pessoas, com quem mais gostei de trabalhar. Grande Abraço, como sempre!
EliminarOLA
ResponderEliminarCMDT SOU VALENTINA ( FROM LAD TO PDL ) GOSTEI DE VISITAR SEU BLOGUE QUE TUDO ESTEJA " CAVOK " CONSIGO E FAMILIA UM ABRACAO AMIGO M.V.
ResponderEliminarValentina! Grande Abraço e beijinhos. Obrigado.
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