Linha Aérea e outros voos - Um Nobre a voar no PREC




Houve um tempo em que todos os “ismos” se instalaram, “tipo Covid”, digamos assim, nas mais inesperadas gentes. Sem remédio nem vacina. Uma autêntica pandemia!

Sem mesmo testes. Quem é que queria fazer um teste?

Bora é ir por aí fora! O Povo é quem mais ordena. Não há cá testes nenhum!

Nós sabemos como conduzir o Povo Unido, que, assim, Jamais será Vencido!






Havia, no entanto, alguns que, derivado á situação (por favor entendam que a maravilhosa palavra derivadoé mesmo a figura literária mais adequada ao momento em que esta história decorre…) dizia eu que havia alguns que derivado às extraordinárias ocorrências que todos os dias o Povo Unido se lembrava de engendrar (solidamente apoiado em ismos justificados a torto e a direito, sem contestação possível) derivado a isso, tinham também os seus dias de ajustes de contas, de libertação da muita raiva contida, sem possibilidade de ser atendida por outro qualquer ismo que se atrevesse a contrariar os que tinham, de supetão, tomado conta, democraticamente, das vidas de todos, concordassem ou não (o Povo Unido Jamais Será Vencido!…) 







Passavam a ter de seguir as novas regras. Quer quisessem ou não.

Era o povo, unido, que tomava as rédeas, finalmente!

Concordo que algumas vezes com razão...

O problema, porém, era o modo como a Democracia era encarada pelos do costume e pelos outros, os que derivavam tudo e, no entanto, aos seus olhos aquilo também era democracia…OK…

Falo-vos do PREC, obviamente. O célebre Processo Revolucionário em Curso que vigorou com muito entusiasmo nos anos 70 do último século.

Esse PREC era o quê?

Explico-vos servindo-me de novo da palavra que me parece nascida de tanta discussão havida, de tantos plenários, de tantos comités, de tanto fervor revolucionário.




















Pois o PREC, acho eu hoje, foi derivado ao forte empenho de alguns membros do Movimento das Forças Armadas empurrados por ideais de alguns partidos políticos, acabados de ser descobertos por um povo sem a mínima cultura democrática, que, colhendo os frutos de tanta injustiça desmascarada, de tanto opróbrio revelado, olhava extasiado para alguns dos homens que mais pugnavam para que a sua razão fosse a de todos, gostassem ou não. Isto vai ser assim! Mai nada!




Um dos mais interessantes exemplos de homem que acreditava, até ao infinito, estar dentro da razão que a todos iria englobar, incluindo os tais que teriam que concordar, mesmo que vissem que a razão, em certos casos, estava mesmo nos antípodas, um desses homens foi um surpreendente primeiro Ministro de Portugal, dos  II, III, IV e V Governos Provisórios, do tal tempo do PREC.

Eram extraordinários os seus discursos. Era fascinante o modo como se exprimia.

Houve até quem debitasse na rádio, imitando-o, com grande gozo para quem sintonizasse o Radio Clube Português, discursos inflamados, cheios de ideias completamente derivadas. Não conheço melhor descrição…

















Era um tal General Vasco Gonçalves.


A seu lado, nesta foto, Otelo Saraiva de Carvalho, pensaria
Sério!? Será verdade o que estou a ouvir?
Não se podia queixar muito porque também disse umas coisas jeitosas...



Era tão fiel a imitação da voz, do entusiasmo característico dos seus discursos, da falta de nexo, da proximidade, até, de um estado paranóico na forma e nas ideias expressas, que eu fui ao Radio Clube pedir que me fizessem uma gravação.

Muito em segredo, como “nos belos tempos” da PIDE.

É que o COPCON não era para brincadeiras!
Podiam meter todos no Campo Pequeno, à força
com mandados de captura em branco, como chegaram a emitir.

















(COPCON era uma espécie de Polícia de Costumes político-militares. Poderoso... o chefe era o Otelo Saraiva de Carvalho. Este aqui




Vais tu e vais tu! E depois logo se veria…


















E passei a ouvi-la quando me dava para isso e não foram poucas as vezes…

Mas não é para falar de política, de Democracia, que vos conto esta história.


O que vos quero contar são alguns episódios, obviamente, derivados desta situação do PREC.


Só possíveis de acontecer num qualquer PREC.


Mas foi no nosso.




Por favor, acreditem-me… Juro!

São absolutamente verdadeiros!

Há imensas testemunhas que o podem atestar.

E, ainda por cima, passados com a mesma pessoa.

Um muito, muito, mas muito estimado Comandante de Boeing B707 de uma também muito estimada e amada companhia de aviação portuguesa.

Não digo o nome do Comandante nem da Companhia derivado à delicadeza dos casos…
Vamos lá então…

Apertem os cintos!




Boeing B707      




E agora descontraiam, não haverá mais derivações, porque a matéria não diz respeito aos fogosos defensores do Povo, mas sim aos valores de um Nobre que esse mesmo Povo obrigara a partilhar todos os seus bens.

Nobre era este Comandante de quem vos quero falar, de família brasonada por direito, Nobre pela maneira como convivia com os demais paisanos seus colegas do ar e do chão.
Inteligente, de um humor cáustico, fazia sempre falta em todas as assembleias que o SPAC (Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil) organizava, exactamente para dar ao Povo, nós, pilotos como ele, o que o Patronato nos queria sonegar.

Mesmo a ele que, aqui, no SPAC, era um dos nossos. Sempre ao lado do Povo, nós.
Das propriedades ancestrais da Família, uma daquelas de que nunca se ouviu falar por isto ou por aquilo, como de tantas outras se ouviu, dessas propriedades, o Povo Unido achou-se com direitos.

Munidos de um altíssimo critério de que “nós é que somos os verdadeiros donos disto tudo” avançaram para aquilo a que se deu o nome de Reforma Agrária, durante o tal PREC.

Um belo dia, salvo seja, o Povo Unido assenhoreou-se de grande parte do Património daquela Família e organizou-se em diversos comités que iriam, finalmente, produzir bens para todo o Povo. Com o esforço desse mesmo Povo todo.

Como é sabido e era esperado, a coisa não correu lá muito bem…

Grande parte das nacionalizações de tanto património latifundiário serviu, isso sim, para mostrar que querer, querer só, não é suficiente. De todo. Saber, não havia…

Aos poucos o entusiasmo foi esmorecendo com a incompetência, com a falta de capacidade de gestão e com o natural desgaste de gerir o que não se é capaz de gerir.

A este Nobre Comandante até nacionalizaram os cavalos...




     IMG da Tribuna do Alentejo


Belos animais que a Família tão carinhosamente tratava. Valeu tudo…




Naturalmente revoltado, o Nobre Comandante, no seio de uma família que fora castigada unicamente por ter bens, herdados, tão antigos, que cuidavam deles com esmero, nutria uma especial aversão a todos os que defendiam aquela selvajaria (a seus olhos) que o separara, de um dia para o outro, de tudo o que o ligava aos seus muito nobres ancestrais.

Ficou-lhe só a memória.

Ainda tentou, uma vez, só uma, acho eu, “vestir” a capa de povo esquecido pelos mais afortunados do país. Talvez quisesse ver como era ser mesmo povo, povo, ele que era Nobre. E Comandante de Boeing B707. Se não foi por esta razão, poderá ter sido para ver se conseguia combinar as regalias de ser povo com uma maldita dor de dentes. Coisa que, infelizmente, também acontece a Comandantes de Linha Aérea de uma grande companhia de aviação.

Terá, certamente, feito os seus estudos sobre a problemática de um cidadão pedir uma consulta de um dentista na “Caixa”. A “Caixa” era a Caixa de Previdência, o equivalente, hoje ao SNS. Terá ido a um centro de saúde espreitar como aquilo funcionava e tirou os seus apontamentos.

Na grande companhia onde voava havia um excelente serviço de saúde para todos os tripulantes. Mas dentista era uma especialidade que teria de ser feita num qualquer consultório privado.

Chegado o dia, lá rumou ele à "Caixa" que lhe correspondia ir, no seu bairro, era a primeira vez, e entrou.






Sabendo o tempo infinito que se esperava para se ser atendido, foi precavido. Levou um cestinho de verga com a merenda. Abriu o cesto num banco corrido, exactamente como os da imagem acima, tirou de lá uma pequena toalha que pôs naquela mesa improvisada e preparou-se para aguardar a sua vez o mais comodamente possível. Não faltava nada, nem prato, nem talheres. Nem tinto. E alguma comida. Não muita, que a demora não seria também assim tão grande…

Caiu mal este aparato, observado dos ghichets das senhoras encarregues de infernizar os utentes com tanta papelada, deixe cá ver, deixe cá ver quando é que o sr Dr lhe pode dar uma consulta...

Uma das funcionárias mais atenta à plateia, não gostou nada do que viu e foi-lhe dizer: o senhor aqui não pode comer! A resposta foi simples. Era a fome e a grande espera prevista. Não aguentava com dores, etc., etc.

Acabou, no entanto, por ser atendido mais depressa do que esperava.

Como é que se chama? E todas as outras perguntas devidas à sua identificação. 
Incluindo a profissão. Que deixou a senhora siderada! Um Comandante! Dos aviões!? Aqui!? Nunca vi…

E de que é que o senhor se queixa?
Dói-me muito um dente, a senhora nem imagina!
O senhor... não está a ver…. Uma consulta de dentista, na Caixa, só daqui a 6 meses! No mínimo!
Seis meses? Está bem, marque lá se faz favor.
O senhor está de baixa médica?
Pois estou, claro. Com o dente assim não posso voar. O médico não me deixa.
Então e vai ficar este tempo todo, seis meses, ou mais, de baixa?
Se for preciso…
O senhor é Comandante dos aviões e não pode ir a um dentista?
Poder posso, mas eu desconto para a Caixa um dinheirão e como tal tenho o direito a um dentista da Caixa, ou não tenho?
Tem, tem. Mas seis meses de baixa… Quer que lhe marque mesmo a consulta!?
Quero, claro que quero! É para que mês? Deixe-me cá tomar nota neste papel, senão esqueço-me...

Muito provavelmente o dente teve uma solução atempada, mas a baixa, uma regalia do povo, essa foi integralmente consumida.

Tempos depois do PREC se ter finado, ainda tudo nacionalizado, mas a vivermos num regime a caminho de uma Democracia plena, um Presidente da República, democrata, eleito livremente pelo povo, tolhido, no entanto por tanta luta havida rumo ao Socialismo democrático, esse homem, convidou o presidente da Venezuela, Carlos Andrés Pérez, acompanhado pela sua mulher Blanca Rodríguez, para uma visita oficial de dois dias a Portugal.


Era uma grande oportunidade para mostrar ao Presidente daquele país da América Latina, para onde tantos portugueses emigravam, maioritariamente Madeirenses, a gratidão do nosso povo a tal acolhimento, do outro lado do Atlântico.

A ideia foi do nosso Primeiro Ministro que teve uma ideia genial, vamos dar um cavalo a este gajo!

O Secretário de Estado ficou encarregue de encontrar um equídeo à altura.
Nada melhor, pensou ele, que um Puro Cavalo Lusitano, conheço um sítio onde os há muito bons!

E foi mesmo requisitado um dos amados cavalos deste Nobre Comandante que, sem o saberem, coitados, também tinham sido nacionalizados, como toda a herdade, incluindo as casas, as alfaias, os cereais de sequeiro e regadio, o olival, a vinha e os pomares, até as forragens, o arrozal, sobreiros e azinheiras, etc., etc.

Duvido que o senhor Primeiro Ministro soubesse cavalgar sela alguma . Ele lá cavalgaria qualquer coisa, pois num trote, numa autêntica cortesia taurina, resolveu oferecer um daqueles fantásticos cavalos, agora pertença do Povo, ao digníssimo Presidente da Venezuela.


















Tome lá este cavalo que lhe damos, (o trabalho que isto deu a criar! Você nem imagina…) em nome do meu país. Espero que Vexa se lembre deste mui nobre gesto e trate como deve ser a grande comunidade portuguesa que vive no seu pais e já agora desta alimária também, OK?










Não sei se foi exactamente isto o que o democrata Representante do Povo lhe disse ou pensou dizer, mas o que é certo é que o pobre animal (que deixou para sempre o seu querido Alentejo) teve de aprender castelhano para entender aquelas gentes de Caracas, aonde foi parar, coitado...





Voltemos ao Nobre Comandante, agora no auge da sua revolta contra o PREC e a Reforma Agrária, que tudo lhe tinha subtraído.

De tal modo que quase deixou a Família em negativos…

Nesse tempo, um copiloto havia que se sabia ser possuído de fervoroso ideal igualitário, tanto, tanto, que volta e meia era visto a vender o que lhe vendiam, mas que ele vendia mesmo, em forma de livros, ás vezes nas estações de Metro, outras vezes à entrada daquela amada companhia de aviação portuguesa.

Eu conhecia-o bem. Era meu vizinho. Nessa altura eu morava nos Olivais.

A sua filha ia volta e meia a minha casa. Era uma excelente companhia para os meus filhos. Gostávamos muito dela.

É este jovem o protagonista de outra história deste blogue, para ler aqui.
(Abre num novo separador e podem continuar por aqui)

Como disse mais atrás, o Nobre Comandante espumava na presença de quem quer que se mostrasse simpatizante de tais ideais dos tempos do PREC.

E aquele copiloto calhou-lhe, por escala, num ou noutro voo. E logo de longo curso. É preciso ter azar…

Como é de ver, não podíamos telefonar às Escalas a dizer "com esse gajo eu não quero voar pá!”

Sempre nos apeteceu a todos, da esquerda ou da direita (posição no cockpit), mas nunca ninguém se furtou ao sacrifício…. Olha, tem de ser!

E quando aquela parelha, improvável (não me refiro aos cavalos, falo agora de pilotos!) se juntava, já se sabia o que iria acontecer…

No cockpit, durante os preparativos para a viagem, num Boeing B707, o Sr Nobre Comandante era obrigado a coabitar com aquele plebeu igualitário, efusivamente defensor dos seus ideais pro-PREC/Reforma Agrária/o Povo é quem mais ordena, etc., etc.

Mas não o faziam no mesmo espaço, apesar de estarem dentro do mesmo acanhado cockpit, onde além destes irredutíveis antagonistas, um Técnico de Voo era obrigado a estar permanentemente, como lhe competia, a consultar o VAR, como no futebol, para ver a quem e como devia prestar atenção a cada momento.

Não era nada fácil para estes nossos colegas, responsáveis por toda a engenharia de um avião

Especialmente porque o Nobre Comandante, já naquela altura, inventara uma coisa semelhante àqueles cubículos que em Hong Kong servem de hotel ou de local de repouso, embora muito confortáveis e de esmerado asseio. Autênticas gaiolas amontoadas por aí acima.

Com uma diferença, e importante. O Tecnico de Voo tinha de ter visibilidade para todos os painéis, cobertos de dezenas de botõezinhos e muitas luzes de aviso. Fundamental!

E como tal, só havia uma solução.

Óbvia! Está-se mesmo a ver!

À chegada ao cockpit, o Nobre Comandante pedia ao Chefe de cabina, ou à Chefe…um jornal, não tabloide, que, para o efeito, não servia para nada e alguns nem para ler serviam. E outros jornais estavam até proibidos de entrar no cockpit por um ou outro Comandante…

Tirava-lhe todo o miolo, ficando só com a página 1 agarrada à última página. Um grande lençol...

Era essa dupla folha de jornal que, pendurada com a ajuda de pequenos pedaços de fita cola aplicados ao painel do tecto do avião, reproduzia, afinal, o que o Nobre Comandante, com toda a certeza deste mundo, devia abominar: o muro de Berlim!







Era isso! Comandante e Copiloto, com visibilidade para ambos os painéis, ficavam irremediavelmente separados por aquela frágil, mas imensamente sólida, parede.

Mas o desgraçado de Leste, ou seja, da direita no cockpit, nada tinha a ver, desta vez, com a construção daquela infraestrutura. Inexpugnável!

E como aconteceu com o muro de Berlim, quem se atrevesse a atravessar para o Ocidente, à esquerda, no cockpit, corria riscos sérios de ser, no mínimo, fuzilado. Sério!

Daí para a frente o Comandante podia exercer tranquilamente as suas funções, com toda a segurança (com segurança acrescida digo eu) sem ter de se abespinhar com a visão de um representante do Povo Unido…

Que, aqui, sim, era MESMO vencido…

Manda quem pode.

Dramático, dramático, era o momento da descolagem.

Todos sabemos que os aviões, no chão, precisam de rodas para circularem de um lado para o outro.

Mas no ar, esse conjunto de rodas tem de ser recolhido. Na Aviação chamamos-lhe “trem de aterragem”. Por causa do atrito, está bem de ver.

É no momento em que o avião deixa a pista, o nariz empinado para o céu, os amortecedores a esticar para o máximo e a subida a manter-se estável, com todos os parâmetros nos valores correctos, que o piloto que vai aos comandos (Comandante ou Copiloto) pede ao outro piloto, que não está ali a fazer nada, pensam vocês, (assunto normalmente adequado a copilotos) que recolha o trem de aterragem, actuando uma pequena alavanca.

A ordem a dar é: Trem em cima!

Ou em Inglês, que dá mais sainete: Gear up!

Na História de Portugal, antes da implantação da República, em 1910, a Nobreza sempre dominou, mais ou menos, o Povo. Uns Reis com tirania. Outros, nem por isso, mas era assim naqueles tempos.

No PREC, em que Portugal mergulhou nos loucos anos 70, mesmo no interior do cockpit de um Boeing B707, também a Nobreza e o Povo se enfrentavam. Sempre com vantagem para a esquerda, o assento do lado esquerdo, o do Comandante, já se vê.

E lá tanto podia estar sentado um “revolucionário” como um outro menos entusiasmado com as novidades vigentes. Naquela ”democracia” dos ares, o do assento da direita, ou concordava com o outro ou ficava calado. Era o melhor que se fazia. Era sempre a minha atitude, que variava consoante o Comandante virava à esquerda ou ao rumo oposto…

Eram confrontos sempre pacíficos, cada um sempre a guardar as suas ideias para depois da chegada ao Hotel, no destino dos voos.

Mas este Nobre Comandante, sobre quem aqui vos conto outros dois episódios seguintes, não adiava os confrontos, era logo ali!

E se não tinha começado já antes a infernizar a molécula a àquele representante dedicado do Povo Unido, este era o momento. Exactamente naquele momento, na descolagem!

Avião seguro, as rodas no ar, mas ainda a rodarem com saudades da pista, já tão lá em baixo, tudo a correr bem, este Nobre Comandante virava-se para o Técnico de Voo (já que o “muro de Berlim” o impedia, felizmente, de ver a cara do “revolucionário” Copiloto) e dizia-lhe:

- Diz aí ao F. da P… do Copiloto para pôr o trem em cima!

A partir daí toda a raiva se esbatia e o resto do voo não tinha mais história…








E foi a esse mesmo Nobre Comandante que lhe calhou ter sido escalado, tempos depois da gentil oferta daquele seu cavalo português ao Presidente da Venezuela, para ir fazer um voo a Caracas.

No dia seguinte ao da chegada ali, pequeno almoço tomado, em vez de ir para a grande piscina do Hotel, onde já estava todo o resto da tripulação, vestiu-se com aprumado gosto, pediu que lhe chamassem um táxi e abalou.

O chauffeur (estamos a falar de um Nobre, tem de ser assim…) muito se admirou do destino que aquele gentleman lhe indicou. Mas fazia sentido, olhando para o Senhor lá atrás sentado.

A viagem era para o Palácio de Miraflores.






Que palácio é este ?, estão vocês já perguntar-se.



Nem mais nem menos que a sede da Presidência da República da Venezuela...


Lá chegado, vencendo aos esses um caótico trânsito sul-americano, o Nobre Comandante dirige-se à Recepção, seguido discretamente por olhares quase invisíveis de agentes da segurança e lá disse ao que vinha.

Quero falar com o Presidente da Venezuela!

Como?!

Era isso mesmo! Ele queria realmente falar com o Presidente da Venezuela!

Não pode ser. Tem de pedir uma audiência e aguardar. Deixe-nos o seu endereço que nós logo o avisamos da data, se a audiência lhe for concedida. Pode não ser…

É bem de ver que não havia telemóveis…

Não senhor. Eu quero mesmo falar, agora, com o Presidente!
Mas não pode! E qual é o assunto?
Um assunto particular que só a nós dois diz respeito.

Pareceu-lhes que talvez houvesse matéria que, hipoteticamente, pudesse interessar ao país.

E então se o encaminharmos para o Ministério do Gabinete da Presidência?
E fica onde?
Neste mesmo edifício…

E assim se viram livres daquele estranho mas bem-apessoado homem.

Segurança reforçada, nunca se sabe o que aqui vai, levaram-no pelo interior do edifício à presença da Secretária do Gabinete da Presidência.

Ao que vem?

Já sabiam, tinham sido avisados, mas pergunta-se sempre.

O Nobre Comandante reafirma querer falar com o Presidente da República da Venezuela.

Neste momento não pode ser, compreenda. Tem mesmo de pedir uma audiência e aguardar.
Essa parte já me tinham dito, mas o assunto é urgente!

Estava a horas de ter de sair do hotel para o Aeroporto. Havia madeirenses que esperavam por aquele dia para irem de férias a casa.

O diálogo, prolongado, chegou aos ouvidos de um membro superior daquele departamento que ficou muito curioso com o assunto: está ali um senhor, português, que quer falar com o Presidente!

Afinal o homem não parecia nada um qualquer malfeitor. Tinha até uma postura elegante, fora revistado â entrada, pouco perigo podia representar, quero ouvir esse português!

E o nosso Nobre Comandante foi levado â sua presença.

Gabinete austero, cheio, como de costume, de fotografias de gente supostamente ilustre. E várias bandeiras. Tudo muito aprumado e com boas mobílias.

Sente-se, esteja à vontade e diga-me o que pretende do nosso Presidente. Saiba que hoje e nos próximos dias, não há possibilidades de lhe marcar uma audiência, lamento.

O Nobre Comandante já não tinha muito tempo e aceitou, então, deixar uma mensagem, não a podendo entregar pessoalmente ao Presidente, como parecia ser o caso.

Muito bem. Pode dizer-me o que tem a dizer que eu mesmo transmitirei o que quiser a sua Excelência o Senhor Presidente Carlos Andrés Pérez.

Apertado entre a impossibilidade de falar ao Presidente e a hora de regressar ao Hotel, o Nobre Comandante lá se resolveu a aceder que a sua mensagem fosse assim, verbalmente transmitida por terceiros e não de viva voz.

E disse-lhe, então:


Olhe, o que eu queria dizer ao Senhor Presidente é que aquele cavalo que lhe deram em Portugal não foi oferecido pelo nosso Presidente.


Ai não?!, perguntou sinceramente admirado aquele alto funcionário, chegando até a cadeira um pouco à frente.

Então quem foi? E era mesmo grande e muito genuína, a sua admiração.



Diga-lhe, se fizer o favor, que, com muito gosto, quem lhe ofereceu o cavalo fui eu


E já agora, como não gostava que o bicho vivesse aqui como um qualquer imigrante clandestino, tome lá todos os documentos que dele tenho.

Está aqui o Boletim de Registo, o Bilhete de identidade e o Certificado das Vacinas contra o Tétano, Influenza, Encefalomielite, Raiva e a Rinopneumonite, olhe que esta última é para dar de 6 em 6 meses!

Explicado todo o imbróglio do sucedido, meteu-se de seguida no táxi, de volta ao Hotel.

Estava reposta a verdade...



Com um grande Abraço para ti, lá onde estiveres.










        Com uma actualização dada pelo António Vieira. Obrigado Amigo.



(Actualizada em 2 de Agosto de 2020)










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