Linha Aérea e outros voos - Uma grande lição de História


Uma grande lição de História


Além de uma lição de História, este é um documento que prova que já na Antiguidade Clássica havia preocupações com a Segurança.

Estranhamente uma questão de segurança em tudo semelhante ao que na TAP ensinavam às Senhoras Assistentes e aos Senhores Comissários de Bordo.

Eu explico, porque este argumento, dito assim, não parece lá muito convincente.

Mas vão ver que é!

Então, dizia eu, à disciplina que versava estes assuntos chamavam-lhe, na TAP, em tempos recuados (hoje talvez tenha outro nome e será com toda a certeza muito mais explícito porque deve ser em Inglês) dizia eu, chamavam-lhe “Salvamento

O Salvamento! Crucial para a segurança daqueles que nos pagavam o ordenado e que portanto tinham de ser tratados com muito cuidado, pudera! Eram aulas cuja única finalidade era precisamente aprender técnicas e rotinas que levassem os tripulantes a executar rapidamente e com eficácia uma série de procedimentos que, era sabido, iriam salvar, daí o nome, muitas vidas. Mas também as nossas.

Duplamente importante, como é de ver…
























Tinha de se aprender, por exemplo, a abrir as portas do avião em emergência, a organizar a evacuação dos passageiros em direcção às saídas de emergência disponíveis, a usar o oxigénio em garrafas portáteis, o uso dos extintores, etc.



Uma das mais complexas operações era treinar para conseguir evacuar um avião, lotado, completamente cheio, em 90 segundos, como a lei exige.

Operação básica neste treino, ainda deve ser assim, é o correcto uso das mangas de salvamento, aquele escorrega em que toda agente desliza desde a porta do avião até ao chão e depois desata a correr não vá aquela coisa explodir...

















Este treino era e continua a ser feito num "mock up". Uma cabina faz de conta, em tudo semelhante à de um avião, como esta imagem mostra.



As portas, ao abrir, podem, ou não activar a insuflação automática das mangas.

Ou seja, é preciso saber, com muito cuidado, com muita atenção, se ao abrir a porta de um avião, em condições normais de operação, não se “arma” inadvertidamente a manga que lhe está acoplada.




Esta saiu sem querer...











Este “inadvertidamente” pode querer dizer que ao abrir-se a porta em estado de “armada” a manga começa instantaneamente a ser insuflada com ar sob grande pressão, podendo causar sério perigo às pessoas que em terra se preparam para encostar a escada ao avião, por exemplo.





      Uma manga arrumada no seu invólucro








Simultaneamente coloca-se, havendo mau uso no manuseamento das portas, o avião fora de serviço porque o recondicionamento da manga no seu lugar habitual é uma operação demorada e complexa.




Há rotinas que em “Salvamento” se aprendem para fazer o uso correcto na abertura das portas. Havendo, ou não, uma emergência.

Vamos supor, por exemplo, que está um dia lindo de Sol e o pessoal vai todo para Punta Cana passar uns dias de férias.



O Chefe de cabina, após todos os veraneantes estarem a bordo e a papelada entregue, pergunta ao Comandante se pode fechar as portas. Se lhe é dado o Ok, o Chefe de cabina avisa todo o pessoal responsável pelo procedimento, para fecharem as portas e “armar” as mangas.

Daí em diante, se houver uma emergência que leve a evacuar o avião, mesmo ainda antes da descolagem, é só abrir as portas que as mangas saltam logo, insuflando-se, como é esperado.

E salva-se toda a gente.

Á chegada a Punta Cana, após o avião ter parado junto à Aerogare, o pessoal pagante todo a pensar na praia ali a dois passos, é necessário abrir as portas com muita atenção.

O Chefe de cabina dirige-se novamente ao Comandante e pergunta-lhe se “está OK para a porta”.

É neste momento, em caso afirmativo do Comandante, que o Chefe de cabina transmite aos mesmos responsáveis pela abertura das portas que as “desarmem”, permitindo o manuseamento das mesmas sem a saída extemporânea das mangas.


      E vai tudo para a praia!






Dizia eu, no início desta história, “que já na Antiguidade Clássica havia preocupações com a Segurança”.


Vejamos se consigo provar-vos este meu raciocínio.


Foi num dia de Verão, com um Sol abrasador, numa cidade linda de morrer, e uma tripulação de luxo.

A minha.

Era eu Comandante de Boeing B727.


A cidade era Roma.


- Vamos aonde? Perguntou alguém.

- Por aí fora! Opinião unânime...


Em Roma é só andar. A pé. Só assim se vê a cidade e as gentes.

Andámos e andámos.









Não tanto como numa outra estadia ali, um outro Comandante, ao fim da manhã, exausto de tanto calcorrear, ao chegar à belíssima Piazza Navona, procurou uma esplanada para descansar os calcantes e finalmente sentou-se.
Estava nas últimas…
- Per favore, cosa vuoi?

O empregado, muito solícito, semi curvado, guardanapo estendido no braço dobrado, estava de imediato ao seu lado.
E como todo o bom português, o Comandante resolveu confessar-se, em “italiano”, achava ele…
- Molto cassato, molto cassato! Tal era o cansaço…

O homem deu meia volta e ele pôde descansar um pouco antes mesmo de decidir o que pedir ao empregado.
Não teve muito tempo para pensar.
Pouco depois, á sua frente, o mesmo empregado, curvado, de bandeja na mão, colocou-lhe na mesa uma cassata de meio metro por 20 cm, mais ou menos.



Perdi-me de novo nesta história…


Dizia eu que andávamos a “fazer” Roma de um lado para o outro, extasiados com tanta beleza, até que fomos parar ao Coliseu.





Um extraordinário Monumento com três andares que albergava, após a sua conclusão, pelo Imperador Tito, no ano 80 DC, 90 mil espectadores (e, felizmente, não todos “espetadores”, porque alguns eram mesmo...)


(Não se esqueçam que este blogue, além de, provavelmente, exibir alguns pontapés na língua portuguesa, está escrito em direcção totalmente oposta ao apelidado "Novo Acordo Ortográfico".)


Um monge inglês, de seu nome Beda, disse no sec VII, sobre Roma e o Coliseu:

"Enquanto o Coliseu se mantiver de pé, Roma permanecerá; quando o Coliseu ruir, Roma ruirá e quando Roma cair, o mundo cairá".


Até parecia que tínhamos corda nos sapatos. Nada nos impedia de andar e andar, por todo o Coliseu…

Um dos Comissários de bordo, um dos muitos colegas nossos com elevada cultura e um grande espírito de partilhar sabedoria, ia-nos dando dicas sobre o que por ali se fez no Século I.




Um gladiador muito parecido com o George Clooney




















Os cristãos deitados às feras, as corridas de quadrigas, os combates de gladiadores, belíssimas execuções, caça de animais selvagens, sei lá, tanta coisa nos disse! Um nunca mais acabar de pequenos dados que nos iam “enchendo” o Coliseu de vida.





Parecia mesmo um dia de atirar gente às feras...



Foi então que, o nosso letrado colega nos contou algo que, depois de eu vos transmitir o que ele nos disse, vão vocês dizer-me se havia ou não noções de Segurança naqueles recuados tempos, a 2 mil anos de distância.




Devia ser assim o Coliseu


Estávamos frente a um esconso corredor que dava acesso aos baixos do hipogeu, normalmente hospedagem de leões e outros animais selvagens, de gladiadores que iam lutar até à morte, mas também e sobretudo, dos cristãos que iam ser devorados por esses mesmo bichos a quem não davam de comer dias antes para o espectáculo ser mais completo. Belos tempos!





















Ficámos então a saber, isto segundo o que o nosso colega nos contou, que era normalmente atribuído a um grande, enorme gladiador, dos que tinham vencido todos os combates em que entrara, a função de controlar o acesso á arena dos gladiadores que iriam combater, dos animais que iriam comer os cristãos, e desse mesmo alimento das feras.




A um sinal do Imperador, as trombetas a tocar, os 90 mil romanos na gritaria do costume, o homem virava-se para dentro e gritava:


- ESTÁ OK PARA A PORTA?!


Haviam de ver a cara dos outros visitantes do Coliseu, naquele dia de muito Sol a olhar para aquele bando de portugueses completamente descontrolados a digerir tal importante conhecimento histórico!



Como acabou a nossa estadia, não me lembro. Mas de Roma nunca mais me esqueci.

Verdade se diga que não foi só por causa deste episódio no Coliseu, obviamente!


Roma tem tanto para ver...


O meu problema, daí em diante até ao fim da minha vida de Piloto de Linha Aérea, passou a ser o que os Chefe de cabina veriam em mim ao perguntarem-me:


- Comandante, está OK para a porta?


(Ó pá, nem fazes ideia do que estás para aí a dizer…)


Com um grande Abraço ao Francisco Góis.







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